O QUE FAZER NA QUARENTENA?
( Tempo de leitura – 10 minutos)
Por todos os lados vejo vídeos e sites ensinando o que as
pessoas devem fazer neste período de quarentena. Não faltam nas redes sociais
posts encorajando o exercício físico, a
arrumação dos armários, das gavetas, do currículo, das contas e por aí seguem
orientações.
Porém, não vi, até o momento, ninguém se perguntando: E se não der certo?
É incrível como as instituições, o mundo, os seres e as famílias possuem medo da morte. O medo da
morte se transforma em pânico tão rapidamente que as pessoas nem sequer
conseguem perceber que o motivo real de estarmos todos parados e trancados se
refere simplesmente ao medo da morte. Estamos apavorados porque realmente e podemso
morrer ou podemos ver a morte em nossa frente.
Não estou falando aqui apenas da morte física. Essa de fato
vai acontecer, seja agora pelo covid-19, ou seja lá no futuro de causa naturais.
A verdade é que vamos todos partir, voltar pra casa, descansar.
O medo ao qual me refiro aqui é mais abrangente. Neste
momento, em que a vida pede pausa, nós estamos percebendo que não controlamos
nada. Essa é a morte do poder que habitava em nós. Nada no mundo e na vida está sob nosso
controle. O rico que tem dinheiro já percebeu que não basta ter plano de saúde.
Se não houver médico e respiradores o dinheiro não será suficiente. Quem diria, ricos percebendo que
suas vidas estão sob o comando de um respirador, não do dinheiro que possuem.
Pobres percebendo que a força de trabalho não é suficiente e
para “ganhar a vida”. Essa força de trabalho, sem o trabalho, não garante o
ganhar a vida. Jovens percebendo que a programação do fim de semana, com baladinha e cinema
morreu. O poder do jovem sobre a vida morre diariamente. Quem diria que os
jovens pudessem ficar em casa, sem sair, sem beber, sem curtir uma vibe muito loca porque simplesmente tudo
parou.
Não podemos ir à igreja. Não podemos nos reunir no amor de
Cristo. Não podemos viajar. Não podemos passear. Não podemos caminhar no parque.
Não podemos ir à escola estudar. A vida parou. E não parou aqui o u acolá,
parou em toda parte. Morreu a pressa. Morreu a vida no piloto automático.
O número de acidentes de carro despencou no mundo todo. O
número de assaltos e de assassinatos diminuiu por demais. Há evidências
concretas da baixa na poluição geral de grandes e pequenas cidades. Todas essas
pausas não lhe diz nada? Para mim diz: morre a crença do homem em achar que
tudo é previsível e controlável por ele mesmo.
A produção e o consumo param. Empresários ávidos por manter
seus lucros foram às redes sócias pedir a volta da senzala ao trabalho. A casa
grande saiu às ruas no dia 28 de março pedindo que voltem ao trabalho ( não
eles, mas seus empregados), sob a alegação de que o país não pode parar. Mas, o pais está parado. O mundo está parado. Eles não podem ver? Ou eles não querem ver?
homens se contradizem: ora dizem que morrer uns 7 ou 10 mil
cidadãos não fará diferença. Outros dizem
que os idosos é que são vulneráveis. Mas,
quando abrimos os jornais vemos jovens e crianças também sendo contaminados,
morrendo. Ou seja, morre aqui, inclusive, a nossa capacidade de entender as
coisas.
Essa pandemia nos mostra que morrendo está o nosso
discernimento. Está morrendo em nós a nossa capacidade de ter lucidez. As contradições
das mídias, as contradições das autoridades, as contradições da orientações que
pipocam de toda a parte e as contradições que habitam em nós mesmos só podem deixar
claro que nós, homens pensantes, já não somos mais pensantes assim. Estamos confusos.
Somos confusão mental.
Fake News é só um nome bonito para dizer que nós homens criamos um
mundo de mentira e agora somos vítimas dele. Criamos mentiras para atacar um ou outro homem
público, criamos mentira para auferir lucro desta ou de outra situação. E agora,
essa mesma fábrica humana de Fake News
nos ataca. Já não podemos mais saber em quem acreditar, no que acreditar ou se
até mesmo podemos acreditar.
Estamos vivendo um tempo de mudança, mas o que se vê e o povo querendo fugir dessa
percepção. Nada vai adiantar você organizar armário, currículo, casa, fazer home office se não houver perspectiva de
vida para você e sua família. Nada adianta se esconder em casa agora se daqui
alguns meses o número daqueles que passarão fome terá dobrado ou triplicado. De
nada adianta agora estar trancado, protegido se em alguns meses estaremos nós
todos mais vulneráveis que nunca: vulneráveis à fome, à violência, ao
desemprego e a tantas outras coisas que agora estamos quase nos esquecendo que
elas existem e vão se avolumar muito depois.
O corona é apenas um vírus perigoso e letal que está batendo
à nossa porta para nos informar que alguma fatura chegou lá em nossa caixa de correio.
Há uma conta para ser paga e esta está no portão da nossa casa, mas nós, todos,
estamos com medo de sair lá para pegar, ver o valor e ver ao que se refere a
tal fatura. Ficar escondido dentro de casa não pagará a conta e não te
informará ao que se refere ela. É preciso ir lá e ver para depois disso feito,
recomeçar tudo para sanar a dívida.
Minha orientação é que não usemos esse período de quarentema
para ficar fugindo das coisas. Minha recomendação é que possamos, de fato,
encarar tudo que temos que encarar. Se o teu casamento não vai bem, essa
quarentena vai te informar o quanto é insuportável viver ao lado da pessoa com
quem você vivendo. Então, resolva isso.
Se os teus filhos te incomodam demais, essa quarentena vai informar que você os abandonou
e que eles estão sem pai e mãe, sem rumo, desbussolados. Então, retome a
educação deles. Crie seus filhos.
Se você está na ansiedade e no desespero por alguns dias
parados, então essa quarentena está te informando que você está vivendo no
piloto automático e assim você não vai longe. Pare e recomece a viver com
qualidade. Ou seja, não descarte, não jogue fora, não ignore esta chance de
aprender a viver nesta quarentena. E, aprender a viver é estar preparado
inclusive para morrer.
Quem espera que a vida seja feita de ilusão, pode até ficar
maluco, ou morrer na solidão. É preciso ter cuidado pra mais tarde não sofrer.
É preciso saber viver – acrescenta o poeta.
Prof. Dr. Geraldo Peçanha de Almeida - Psicanalista